Na homenagem à Consciência Negra, comemorada no dia 20 de novembro, retomo a série de matérias em dose dupla: um pouco da história dos irmãos baianos Antônio Pereira Rebouças Filho (1839-1874) e André Rebouças (1838-1898).
Eles são considerados os primeiros afrodescendentes brasileiros a cursar uma universidade e os dois maiores engenheiros do Brasil no século XIX.
O caminho profissional traçado pelos dois irmãos parece ter vindo de uma inspiração familiar. O pai deles, Antonio Pereira Rebouças (1798-1880), filho de uma escrava alforriada e de um alfaiate português, foi um dos poucos advogados negros a ocupar um cargo relevante no período do Brasil Imperial e atuou como conselheiro de Dom Pedro II.
Os irmãos Rebouças concluíram a trajetória acadêmica na Europa e se especializaram na construção de estradas. Quando voltaram ao Brasil, foram responsáveis pelos estudos e soluções técnicas da Estrada de Ferro Paranaguá-Curitiba, considerada a maior obra da engenharia férrea nacional.
Também é de autoria deles a elaboração do projeto de distribuição de água na cidade do Rio de Janeiro. Aliás, eles fizeram a primeira canalização de água potável em Curitiba.
André Rebouças começa uma trajetória de ativismo contra a escravidão quando se muda para a capital fluminense, após a morte do irmão. Ele também lutou no conflito contra o Paraguai, participando da Batalha de Tuiuti.
O Túnel Rebouças no Rio de Janeiro leva este nome em homenagem aos irmãos. Próximo à entrada do local, na Praça José Mariano Filho, foram construídos bustos para lembrar a contribuição dos Rebouças. Cidades como São Paulo, Porto Alegre, Curitiba e Rebouças (Paraná) nomearam obras dando reconhecimento aos irmãos.
O pai da geografia brasileira
O geógrafo baiano Milton Santos (1926-2001) construiu a carreira como formador de opinião, intelectual e professor universitário, com reconhecimento internacional, numa área que dá poucas oportunidades aos negros.
“O levantamento mais recente sobre esse espaço vazio revela que menos de 1% dos docentes que atuam nas universidades públicas são negros, segundo o livro “Inclusão Étnica e Racial no Brasil” (Attar Editora), de José Jorge de Carvalho.”
Além desse protagonismo, Milton ditou rumos na geografia, que, conforme ele mesmo explica: “é uma disciplina criada com a vocação de descrever o mundo, às vezes, de maneira crítica”. Ele expandiu a área para além dos números e estatísticas, trazendo reflexões sobre o espaço, a sociedade e a política.
Milton também exerceu a profissão de jornalista e ocupou cargos públicos. Em 1964, deixou o país, devido ao golpe militar, iniciando a carreira internacional em várias universidades.
No final da década de 1970, retorna ao Brasil e reinicia sua trajetória por aqui. Doze universidades brasileiras e sete estrangeiras lhe dão o título de Doutor Honoris Causa. Em 1994, é o único intelectual fora do eixo anglo-saxão a receber o prêmio Vautrin Lud, considerado o “Nobel” da geografia.
Ao conhecer um pouco mais de Miltons Santos, podemos:
- refletir sobre por que poucos negros chegam a ocupar cargos de liderança e de educadores no Brasil;
- disseminar essa trajetória para inspirar pessoas;
- perceber que a busca pelo conhecimento abre caminhos para o reconhecimento profissional.
Conteúdo complementar:
- o livro “Por uma outra globalização” é indicado para curiosos e “não geógrafos”, pois Milton Santos traz uma linguagem que facilita o entendimento de temas mais científicos;
- o documentário “O mundo global visto do lado de cá”, do cineasta Sílvio Tendler, traz uma série de entrevistas com o geógrafo sobre a globalização do ponto de vista das comunidades carentes e da periferia.