Aproveitando a data do Dia Mundial da Visibilidade Trans, em 31 de março, o blog do Átila, o Uno, dá destaque às escritoras trans e a uma autora que aborda este tema em seus livros, para fechar com chave de ouro a série Mulheres na Literatura.
Recentemente, a temática trans, aos poucos, ganha espaço na literatura, num universo ainda dominado por escritores homens. Para se ter uma ideia, uma pesquisa acadêmica traça um breve perfil de como é o escritor brasileiro das grandes editoras: homem branco, de classe média, nascido no eixo Rio-São Paulo. Os personagens dos seus livros também seguem essa tendência. O levantamento avaliou 692 romances, escritos por 383 autores, em três períodos: de 1965 a 1979, de 1990 a 2004 e de 2005 a 2014.
Mesmo diante desse cenário, há números que apontam uma ligeira mudança. Uma pesquisa realizada pela escritora travesti Amara Moira, divulgada no site Geledés, aponta que, nos últimos dez anos, a produção editorial com a temática trans trouxe seis obras publicadas na década de 1990, duas nos anos 2000 e 57 nos anos 2010.
Isso mostra que a literatura vem acompanhando uma tendência vista no cinema e na TV, que já consagraram, por exemplo, as irmãs trans e diretoras Lilly e Lana Wachowski, responsáveis por sucessos como a trilogia “Matrix” e a série “Sense 8”, esta com uma protagonista trans no elenco.
No entanto, as personalidades trans cruzam uma difícil barreira, retratada nas estatísticas, que são semelhantes em muitos países. Por exemplo, o Brasil ainda está em primeiro lugar no ranking mundial dos assassinatos de pessoas trans, cuja expectativa de vida não passa dos 35 anos. E, quando se olha para o mercado de trabalho, o desemprego chega a 90%, de acordo com dados da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).
Por isso, é tão necessário dar visibilidade às artistas, para que elas possam, cada vez mais, abrir as portas para outras gerações. E se espelhar nelas, como símbolos de luta e superação. Vamos conhecê-las?
Ruddy Pinho (1944-2021)
Ruddy Pinho, que faleceu recentemente, ficou conhecida por ser cabeleireira dos famosos. Carregava consigo o título de primeira escritora trans a publicar um livro no Brasil. Com uma bagagem literária diversificada, lançou 10 livros, entre contos, poemas e duas autobiografias: “Liberdade ainda que profana” (1998), que aborda o período da infância até os seus primeiros 10 anos da transição de gênero e “Nem tão bela nem tão louca” (2007). Chegou a ser premiada pela Biblioteca Nacional, com o conto “In…confidências mineiras e outras histórias” (1999).
Cassandra Rios (1932-2002)
Lésbica, ela recebeu a alcunha de “escritora maldita” durante o regime militar (1964-1985), com 35 dos seus 50 livros censurados na época. No entanto, mesmo sendo perseguida, se tornou sucesso de público. Cassandra Rios, pseudônimo de Odette Rios, foi a primeira autora a ultrapassar 1 milhão de vendas e a viver somente por meio da literatura. Admirada por escritores como Jorge Amado, também trouxe pioneirismo ao retratar personagens trans nos livros “Georgette” (1956) e “Uma mulher diferente” (1965). Sua primeira obra, “A volúpia do pecado”, escrita aos 16 anos, aborda o romance entre duas mulheres e o prazer feminino, tema que dominou seu legado literário.
Amara Moira
A sua lista de referências literárias passa por Hilda Hilst, Clarice Lispector, Carolina de Jesus, Cassandra Rios e Ruddy Pinho. Amara Moira é travesti, doutora em Teoria Literária pela Unicamp, trabalhou como prostituta e escreveu “Se eu fosse pura” (2016). É também co-autora de “Vidas trans: a coragem de existir” ( 2017).
Charlie Jane Anders
Premiada escritora trans norte-americana, duas vezes ganhadora do Hugo e Nebula, referências nos gêneros literários de fantasia e ficção científica. Sua obra “Todos pássaros do céu” (2017) esteve entre os cinco títulos selecionados pela revista Time. Neste vídeo abaixo, ela fala sobre os desafios para se construir um futuro melhor, usando a imaginação. Vale a pena conferir!