O segundo cd de Tulipa Ruiz, Tudo Tanto, foi o teste para comprovar seu cacife musical no cenário fonográfico. Agora, a turnê que leva o mesmo nome do recente trabalho se torna mais uma maneira de remarcar território.
O show ontem, no Circo Voador, na capital carioca, mostrou muito bem que a cantora deixou de ser promessa da música brasileira. Tulipa Ruiz permanece suprema.
Em comparação com a primeira série de shows do ano passado, tudo (tanto?) leva a entender que a cantora segue aprimorando sua estratégia: fugir da normalidade e do ordinário.
Não bastasse sua extensão vocal continuar poderosa, invejável e intrigante, ela mostra que recicla o status de uma artista em expansão, inclusive no palco.
Realmente, Tulipa baldeia ao trazer referências de Yoko Ono. Só que a cantora brasileira é mais sutil no experimentalismo performático. Só há espaço para exageros na extensão vocal, que também são muito bem vindos.
Indiscutível o que ela consegue fazer com a voz ao cantar Víbora. Um jeito peculiar, dramático e potencializado, tudo (tanto?) numa artista única. Tulipa tem uma qualidade tão extraordinária e divina ao cantar que há tempos não se via na música brasileira desde Cássia Eller.
Plainava no ar se ela realmente conseguiria segurar a onda sonora do que se ouvia no cd. Espante-se. Ela vai muito mais além. Há de se ressaltar que são características raras em tempos de banalização de autotunes.
Tudo (tanto?) vira um ode misturado com elementos muito bem produzidos como, por exemplo, figurino arrojado, cenografia intimista, projeções de vídeo cinematográficas e uma banda harmônica e mais uma vez, afinadíssima.
No entanto, Tulipa chegou ao ponto, em pouco tempo de carreira, em um imbróglio característico daquele tipo de artista que é singular: conseguir ter todas as canções incrivelmente boas. O que escolher para colocar no setlist que vai agradar uma legião de fãs cada vez mais catárticos?
Dificilmente, ela faria um show com todas suas 22 canções. Sempre vai haver uma que algum fã irá reclamar de não ter tocado. Mas causou um pouco de decepção não ter incluído Sushi e Brocal Dourado (ambas do cd Efêmera), a primeira loucamente pedida pelo público. Ainda mais em um show que repetiu outras duas músicas sem o mínimo de necessidade (apesar de também serem deliciosas).
Mesmo assim, Tulipa consegue renovar um cenário de shows, que anda disfarçado de uma pirotecnia deplorável de festa junina, com hits cada vez mais monossilábicos impetrados por outros ritmos musicais. Mais uma vez prova que música de qualidade se faz com louca poesia e sem parecer pedante.