No mercado fonográfico, costuma surgir uma maldição que atinge determinado artista depois do seu primeiro álbum grandioso.
Tulipa Ruiz mostra o contrário. Dá pra ser feliz com o segundo disco da carreira.
Tudo Tanto é bem mais alegre e jovial que Efêmera, álbum que catapultou a cantora no cenário musical brasileiro.
Produzido pelo próprio irmão, Gustavo Ruiz, Tudo Tanto passeia por um experimentalismo vocal e sonoro, impecavelmente superior e muito bem trabalhado, mesmo que se tenha saudade de toda aquela “simplicidade” do disco de estreia.
Em Víbora, que traz a melhor parceria vocal do cd, Tulipa adapta a versatilidade de Criolo a sua própria maneira, dando outra dimensão musical, dramatizando inclusive gargalhadas e sussurros.
Tulipa é perspicaz. Brinca e abusa da sua invejável extensão vocal sem parecer previsível.
Debruça a garganta no melhor estilo Gal Costa de cantar.
Em outro momento, como na inesquecível “Like This”, suaviza com seu timbre semelhante ao de Tetê Espíndola.
Realmente, não há espaço para o medo de reverenciar algumas lendas musicais. Ao longo do cd, percebe-se passagens pela banda Seco e Molhados, um exemplo é Script.
Tão pouco há vergonha de beber o pop bucólico de Lulu Santos, companheiro dela em “Dois cafés”.
“Bom” é o melhor fruto do pop florestal criado por Tulipa, com letra invasiva e reflexiva. Quem não martela o pensamento ao ouvir “Por que estar vivo já foi mais estranho…”?
Tulipa ainda semeia filosofia ao questionar “Nem sempre dá pra ser bom…” e “…você bem tem que trocar um pouco”.
“É” poderia entrar no clichê das baladas românticas, mas a cantora se sobressai quando fala de amor sem deixar de ter uma crise existencial. Traz toda dualidade apaixonada que houver nessa vida. Incrível como Tulipa está cada vez mais “cazuziana”.
É o pop que floresce em todo tipo de terreno. “Ok” mostra uma grande sacada ao imitar a sonoridade como se ondas invadissem a música.
“Quando eu achar” traz o mesmo embalo marítimo mais praiano. A pegada reggae casou bem com a molecagem na palavra pestanejar. Outra surpresa é o coro final, que cá pra nós é simplesmente primoroso e clássico.
Dá pra notar que o pop florestal de Tulipa está enfeitado com as mais variadas cores de papéis celofanes. À medida que a luz bate e ilumina, enxergamos diversas tulipas.