O álbum M.D.N.A, lançado oficialmente hoje, é um sequenciamento genético feito por Madonna ao longo de três décadas como rainha do pop.
Um disco que destaca o “RNA Madonna” em si merecia pelo menos um encarte mais majestoso. Mas vamos ao que interessa.
Girl Gone Wild abre o cd e com certeza serve para as pistas de dança. Começa com uma confissão que remete a fase Like A Prayer, exorciza um refrão feminista, com as batidas da fase Confessions On A Dance Floor.
Indiretamente, Madonna diz aqui que nunca deixou de ser Dita (alter ego da cantora no álbum Erotica).
Gang Bang traz a parceria com o cantor libanês Mika na composição. É a melhor música do cd.
Violenta, sarcástica e totalmente underground. Alguém pode fazer a alusão a Bang Bang, de Nancy Sinatra.
A canção chegou a ser regravada por Cher na década de 80. Nos anos 2000 fincou como a trilha sonora de Kill Bill, filme dirigido por Quentin Tarantino.
As duas produções são totalmente antagônicas musicalmente. A música de Nancy é a visão de uma vítima. Já Madonna encarna uma assassina feminista passional.
I´m Addicted justifica as suspeitas de que o anagrama M.D.N.A significaria a droga tão famosa em boates (MDMA/Ecstasy). Traz uma batida eletropop viciante, com um refrão final certeiro. É como se Madonna injetasse em nossas veias os álbuns Confessions e Music de uma só vez.
Some Girls trouxe uma descartável mudança na voz de Madonna que a deixou radicalmente robótica. Fez a canção perder força apesar de trazer uma batida nova na carreira da cantora. Acabou se tornando o tipo de música pra correr na esteira da academia e só. Um desperdício.
Give Me All Your Luvin distoa do resto do cd. Mas há algo nela que é típico de uma música pop pegajosa. Traz a parceria com as cantoras M.I.A e Nick Minaj. Refrão fácil, mas que é essencialmente ácido e sarcástico.
Por falar em música pegajosa, Superstar é outra canção que tem um refrão bobo, mas que fica na cabeça por muito tempo. Tem a participação da filha Lola.
I Dont Give A vem com mais uma parceria da rapper Nick Minaj. Traz um pouco da fase boa de Bedtime Stories, circundando também o álbum Hard Candy. É uma nítida resposta para o ex-marido Guy Richtie e uma cutucada nas sósias atuais (como boa parte das canções de MDNA).
I´m a Sinner é um ode ao hedonismo. Refrão que gruda com uma composição deliciosamente safada. Os riffs de guitarra lembram um pouco as canções Ray Of Light e Beautifull Stranger. Lá no final soa uma batida funk e alguns sussurros contagiantes.
Love Spent vem com duas versões no álbum comprado no Itunes. A original é aposta mais arriscada de Madonna. Sonoridade com uma batida que lembra um pouco o funk carioca, misturada ao eletropop europeu e ao rap norte-americano.
A música tem dois momentos musicalmente diferentes, mas que se acertam com os acordes de um banjo. Faz todo pop que você escutou até hoje parecer tão “reductive”.
Love Spent também tem uma versão acústica que inclui o hall de baladas românticas, seguidas por Masterpiece, Falling Free e I fucked up. Madonna insere uma sonoridade marcante com composições brilhantes. Repare que voz dela quase embarga de tristeza ao cantar Falling Free.
E I Fucked Up traz uma grande sacada musical. É como se a canção fosse tocada em LP, dando umas derrapadas de propósito. É o lado triste, um tanto melancólico do álbum. Essas canções mostram uma mulher que se apaixona perdidamente e que sofre como qualquer mortal. Resumindo: separe o vinho ou martini porque é fossa!
No meio das três baladas está Beautifull Killer pra não deixar ninguém cortar os pulsos durante a audição do CD. Aqui, Madonna codificou os genes dos álbuns Music, Ray Of Light e American Life. Só poderia resultar nessa canção poderosa.
Agora, só Madonna pra fazer a funkeira M.IA cantar o hino pop idiota, B-Day Song. Já Best Friend vai fazer muita gente lembrar de Hard Candy. No entanto, Madonna e Martin Solveig acertam na batida funk não deixando de lado o forte traço pop da cantora.
M.D.N.A demarca as características musicais hereditárias de uma cantora que abriu o caminho para tudo que se vê por aí no pop feminino hoje. Além disso, conseguiu ser tão atual e visionário como não se poderia imaginar.
De certa forma M.D.N.A, como foi o disco Bedstime Stories na sua respectiva época, é um álbum embrionário incrível. É um disco conflitante, mas não de forma pejorativa.
As músicas são obscuras, apesar de algumas serem feitas para a pista de dança e outras emanarem um clima adolescente. Mas ele é coerente com o que cantora personifica: as várias Madonnas.
Uma Madonna que sempre falará de sexo, pecado e religião, mas que agora também está revoltada com o desgastado cenário pop atual e angustiada com sua vida pessoal.
Outra novidade é que todas as músicas mudam de sonoridade no decorrer do processo e sempre acertando a melodia.
Creio que Madonna nunca deu tanta ênfase como agora no seu gene musical original, e de olho lá no futuro.
Conseguiu impor seu estilo mesmo trabalhando com produtores fortes da cena eletrônica: Martin Solveig, Willian Orbit, Ale e Benny Benassi, entre outros. Está dado o recado: “Madonna cria, as outras copiam e ela recria”! E isso aos 53 anos.