Recentemente, o caso Moïse reabriu uma ferida indigesta sobre xenofobia no Brasil. Em 24 de janeiro, ele morreu depois de ter sido espancado por um grupo de homens num quiosque, na Barra da Tijuca.
Moïse Mugenyi Kabagambe tinha 24 anos e veio da República Democrática do Congo. Em 2014, chegou à capital fluminense, aos 11 anos, como refugiado, para escapar da guerra civil onde morava.
Como ele, mais de 50 mil pessoas foram reconhecidas como refugiados políticos, entre 2011 e 2020, no país. Deste contingente, mais de mil são congoleses, conforme relata o podcast Café da Manhã, da Folha de São Paulo.
Xenofobia além das fronteiras
Em entrevista ao Nexo, João Carlos Jarochinski, acadêmico na Universidade Federal de Roraima, que pesquisou a questão migratória, explica:
“Etimologicamente, xenofobia seria aversão ao estrangeiro, àquele que vem de fora. Alguns estudos pontuam que essas pessoas migrantes e refugiadas já estão entre nós, motivo pelo qual a xenofobia seria a manifestação de preconceito de caráter racista.”
Ele também destaca que há o cruzamento de três tipos de sentimentos discriminatórios no caso Moïse: xenofobia, racismo e aporofobia, que é a aversão a pobres.
E isso é tão comum no Brasil quanto se imagina. Por exemplo, há alguns anos:
- alojamentos de estudantes africanos foram incendiados na Universidade de Brasília (UNB);
- um empresário e policiais assassinaram um universitário da Guiné Bissau, na Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT);
- a estudante angolana Zulmira de Souza Borges Cardoso foi morta num bar, no centro de São Paulo;
- em 2021, foram divulgados vídeos com xingamentos contra haitianos dentro de um ônibus em Goiânia.
Imigrantes e refugiados na sétima arte
O cinema pode ser um grande aliado na hora de compreender culturas tão distintas, que vão além dos nossos mundos.
O blog do Uno separou alguns filmes que abordam a situação de imigrantes e refugiados de vários países. É um momento necessário para debater isso no trabalho e em casa. Vamos lá?
TFH: Aeroporto Central – dir. Karim Aïnouz (2018)
O premiado diretor brasileiro Karim Aïnouz (“Madame Satã”,“Céu de Suely”, “Praia do Futuro” e “A vida invisível”) traz, neste documentário, a história de Ibrahim, estudante sírio, de 18 anos, e de Qutaiba, fisioterapeuta iraquiano. Eles, como tantos outros imigrantes e refugiados, vivem nos hangares de um extinto aeroporto em Berlim. Classificação indicativa: livre. Onde assistir: Google Play.
Era o Hotel Cambridge – dir. Eliane Caffé (2016)
Sob a constante ameaça de despejo, refugiados recém-chegados ao Brasil dividem espaço, com um grupo de sem-tetos, em um velho edifício abandonado no centro de São Paulo. Olhar sensível da talentosa diretora brasileira Eliane Caffé (“Narradores de Javé” e “Kenoma”). Classificação indicativa: 12. Onde assistir: Apple TV.
Ali – dir. Michael Mann (2001)
Will Smith interpreta Cassius Clay, habilidoso boxeador, reconhecido pela sua inteligência, inclusive fora dos ringues. O filme aborda sua conversão ao islamismo e a troca de nome para para Muhammad Ali, na década de 60, numa época turbulenta e repleta de preconceitos e discriminação nos EUA. Classificação indicativa: 12. Onde assistir: Amazon Prime, HBO Max, Telecine, Globoplay, Net Now Claro e StarZ.
Fronteiras – dir. Apolline Traoré (2017)
Quatro mulheres de diferentes regiões da África se conhecem durante uma perigosa viagem entre Senegal e Nigéria. Ali, elas desenvolvem laços afetivos diante de comportamentos discriminatórios que encontram pela frente. Classificação indicativa: 10. Onde assistir: na internet.
Além da Fronteira – dir. Michael Mayer (2012)
Um estudante palestino e um advogado israelense se apaixonam num cenário tenso, onde seus países estão em conflitos há décadas. A relação dos dois é virada de cabeça pra baixo, quando uma intriga política e local força a deportação de um deles. Classificação indicativa: 12. Onde assistir: Amazon Prime, Looke e Apple TV.
Cafarnaum – dir. Nadine Labaki – (2018)
A cineasta e atriz libanesa Nadine Labaki (“Caramelo”) narra a tocante história de Zain, um menino de 12 anos, bastante maduro para a idade, que decide morar nas ruas, para fugir dos pais negligentes e após não concordar com o casamento forçado da irmã. A vida do garoto muda ainda mais quando passa a cuidar de um pai e seu filho, refugiados da Etiópia. Classificação indicativa: 14. Onde assistir: Amazon Prime, Looke, Google Play e Apple TV.
Crash – No Limite – dir. Paul Haggis (2005)
Personagens de diferentes etnias, raça e cor se encontram casualmente em Los Angeles, uma das cidades norte-americanas reconhecidas pela sua diversidade. Mas ela guarda também conflitos, preconceitos e discriminações com impactos chocantes nas vidas dessas pessoas. O filme conquistou o Oscar nas categorias: melhor filme, roteiro original e edição. Classificação indicativa: 14. Onde assistir: Google Play.
Incêndios – dir. Denis Villeneuve (2010)
Após a morte da mãe, um casal de gêmeos é surpreendido ao receber dois envelopes no testamento. Uma carta é dirigida ao pai, até então, considerado morto por ambos. A outra faz referência a um irmão de quem nunca tinham ouvido falar. Diante disso, em momentos distintos, cada um deles decide ir atrás de respostas sobre o passado nebuloso, repleto de cicatrizes, em um país abalado pela guerra, intolerância e xenofobia. A história também foi adaptada para os palcos brasileiros, com atuação de Marieta Severo e grande elenco. Classificação indicativa: 14. Onde assistir: Globoplay.
E você? Lembra de mais algum filme que não está na lista? Indique nos comentários.
E se quiser se aprofundar um pouco mais na reflexão, baixe o PDF “Nós, os refugiados”, da filósofa de origem judia Hannah Arendt, considerada uma das pensadoras mais importantes do século XX. O texto também se encontra disponível neste link.