Renascer não é um processo fácil, ainda mais para Christina Aguilera. Seu mais novo trabalho intitulado Lotus era a esperança pela volta triunfal, depois do fracasso comercial que foi Bionic.
Se este sétimo álbum da carreira será um sucesso é difícil afirmar agora. Mas está longe de ser um renascimento. Ele reproduz basicamente tudo que já se ouviu nos últimos 10/20 anos no mundo da música.
A capa do cd faz referência a pintura Nascimento de Vênus do pintor italiano, Sandro Botticelli, que endeusava aquela beleza clássica (rechonchuda) de uma determinada época.
Christina Aguilera não surge numa concha conforme a Vênus do quadro, mas em uma flor-de-lótus (padma), que é conhecida no Oriente por significar pureza e meditação.
A simbologia da flor também é associada a Buda (por favor, sem piadinhas infames com relação a forma avantajada da cantora) e tem um aspecto interessante ao florescer em terreno pantanoso.
Talvez a arte conceitual da capa seja o único ponto convergente. Por outro lado, o conteúdo musical é uma esquizofrenia de gêneros, realmente uma flór-de-lótus afundando na areia movediça. Nem Bionic foi um trabalho tão catatônico.
A única surpresa é que Christina foi plantar a sua flor-de-lótus justamente na fonte das novatas do universo pop. Ela resolveu deixar suas principais referências como Billie Holiday, Etta James, Whitney Houston, Donna Summer, Patti La Belle e Aretha Franklin pra trás. Na berlinda ainda dá pra encontrar a pegada rap/pop já trabalhada por Mariah Carey e Madonna.
É extremamente forte o pop de Rihanna, Shakira, Kelly Clarkson, Katy Perry, Kylie Minogue, Britney Spears e pasmem: Kei$ha. Um doce pra quem acertar a outra artista que já faz isso há algum tempinho…
Talvez Xtina, como é conhecida pelos fãs, esteja tentando atingir um nirvana, ainda buscando sua identidade musical, que se perdeu anos atrás e até hoje não ultrapassou seu dinamismo alcançado com Back To Basics e Stripped.
Tudo soa mais uma vez como desespero. Antes tivesse colocado o nome desse novo álbum de Despair e assumisse uma crítica ferrenha a tudo o que se tem ouvido aí ultimamente. E melhor, fosse ocupar o vazio musical deixado por Amy Winehouse.
A sonoridade de Lotus funcionaria se ele fosse desmembrado e tivesse seus gêneros separados em álbuns futuros. Ao juntar tudo num samba de uma vênus doida o resultado sugere algo sem coesão, com uma enxurrada de autotunes.
Se até Cristina está abusando do programa de afinar/distorcer a voz, não sei o que vai ser da música daqui alguns anos. Infelizmente, a cantora deixou pra segundo plano sua característica mais marcante, uma voz que é incrivelmente poderosa e pura por si só.
Pelo visto, a regra é atirar pra tudo quanto é lado.
Descartáveis:
Lotus Intro = tem uma letra linda, que fala de renascimento, mas traz elementos sonoros africanos e latinos, misturado com batidas raps, que Shakira já usa há anos.
Army of Me= música poderosa que tem tudo pra virar hit, mas tem a mesma batida, gritinhos e composição de Stronger da Kelly Clarkson. Lembra também um pouco Fighter da própria Xtina.
Red Hot Kind of Love = já imaginou um dueto entre Hilary Duffy e Kylie Minogue? O resultado é isso aqui. Os gritinhos são os mesmos de um pop chiclete adolescente.
Let There Be Love = A equação Get Together mais Girl Gone Wild de Madonna.
Sing Of Me, Blank Page, Light Up The Sky, Empty Words e Best Of Me= nada de muito diferente que Xtina fez nas músicas mais lentas ao longo da carreira.
Circles = aqui tudo soa exagerado, fora do lugar, experimental demais, desconexão sonora de vários estilos numa mesma música. Sobra até um Mother Fucker no final que também não é original.
Your Body = primeiro single, parece ter sido a escolha certa como tal. Mas é uma música puramente comercial, sem muito o que dizer. Nada de diferente do que Xtina já teria feito. A extensão vocal estourando os tímpanos, as mesmas batidas eletrônicas de outras cantoras.
Merecem atenção:
Cease Fire = é o primeiro acerto experimental de Xtina, mas note que é a a aposta mais arriscada do álbum e o caminho mais interessante para cantora. Se tivesse seguido esse compasso teríamos algo sofisticado de ouvir por todo disco.
Make The World Move = apesar de ter autotunado a voz de Cee Lo Green, a sonoridade é marcante e se assemelha com aquele timbre do Fine Young Cannibals em She Drives Me Crazy.
Just A Fool = pegada country oitocentista em parceria com Blake Shelton, parceiro de Christina Aguilera no programa The Voice. Uma das músicas mais belas de se ouvir. É aquilo que Lady Gaga não conseguiu fazer com You and I.
Around The World = Misturar versos em francês em músicas norte-americanas não é novidade no mundo da música, mas aqui o interessante notar é que a batida vinda da black music encontrou simbiose com a veia pop.
Shut Up = tirando os palavrões desnecessários ao longo da música, o que presta aqui é a sonoridade, o clima dos anos 90.
Remix de Your Body = infinitamente superior ao single que está tocando nas rádios. Tem um dubstep mais underground diferente do utilizado pela maioria.